Uma Leitura Crítica Sobre O Instrumento Prova Para O Ensino De Filosofia. (parte II)
Westerley A.Santos- Prof. Filósofo. Ago/2003
No caso da Filosofia e talvez das
Artes e a Educação Física, por mais que não se admita, ao se utilizar a Prova como elemento de avaliação do
aprendizado, acaba-se avaliando não o aprendizado mesmo, mas sim o próprio objeto
prova. Isso porque, não são
considerados, nesse tipo de avaliação, aspectos mais humanos da formação do
sujeito, da pessoa do aluno, que são objetivos naturais do ensino da Filosofia
e de outras disciplinas como as citadas. Por exemplo: na prova (tradicional)
não se avalia ou considera o momento psicológico em que o aluno se encontra;
sua situação emocional, conflitos e problemas vividos, condições de saúde,
condições econômicas, alimentares, para realizar a prova. São elementos que interferem diretamente no
resultado deste tipo de avaliação e que muitas vezes, demonstram não uma
deficiência do conhecimento do aluno, mas sim, uma dificuldade nas condições
deste para realizar a prova.
Há estudos de que 20% dos nossos
alunos, possivelmente sofrem de Dislexia que é causa ainda ignorada de evasão
escolar em nosso país. E uma das causas do chamado "analfabetismo
funcional" que, por permanecer envolta no desconhecimento, na
desinformação ou na informação imprecisa, não é considerada como desencadeante de
insucessos no aprendizado. O mesmo ocorre com a Discalculia. Assim, a avaliação pelo instrumento prova não consegue detectar situações
como estas, pois, não atinge a avaliação da aprendizagem mais profunda, e não
completa o sentido diagnóstico que deveria atender nestes casos.
Outro aspecto é o da relação
ensino-aprendizagem. Na prova como
instrumento tradicional, não há espaço ou pelo menos a prática da crítica do
aluno e nem para a autocrítica do Professor. Isso porque, nesse método na
prática, não há troca. Não é uma relação direta, professor/aluno. Trata-se de
uma relação indireta, unilateral, mediada pelo instrumento. Portanto, aspectos
importantes e fundamentais para os sujeitos do processo de ensino/aprendizagem
são desconsiderados na avaliação pela Prova.
Usualmente as provas são de múltipla escolha ou de relação de ideias
semelhantes ou contrárias, não havendo um retorno descrito, analisado,
argumentado, debatido com o aluno. Na verdade, há na prática, uma confusão
sobre o que é avaliação. O que se
prática mesmo, são testes, e testes não são avaliações; são elementos de
classificações ou seleção.
Esse fato torna esse tipo de
“avaliação” injusto e irrelevante, pois há neste instrumento um vício de
origem, chegando até a se tornar um instrumento de opressão, pois, não avalia
de fato o conhecimento do aluno, quando muito, avalia sua memória. Ao mesmo
tempo em que é para o Professor, um atestado assinado pelo aluno de que ele é o
único responsável pelo nível de sua aprendizagem ou falta dela, já que a prova
é uma posição unilateral.
O professor, muitas vezes se
escuda por trás das questões dadas na prova,
deixando toda a responsabilidade do aprendizado na resposta dada pelo aluno, já
que não há discussão, debate, interação sobre o processo avaliativo, neste tipo
de instrumento; no lugar disso, há um gabarito para correção de respostas
irrefletidas e estáticas para fins de nota. A relação é técnica-instrumental e
bancária.
A Filosofia retornou ao ensino
médio justamente para fazer o contraponto à lógica do ensino puramente
técnico-instrumental e bancário, conscientemente ou não, é de sua natureza a
crítica deste sistema que visa somente os fins, no caso a nota, quando deveria
se ater aos meios, ao processo de aprendizagem.
É princípio pedagógico da Filosofia
a construção conjunta do saber, na relação direta entre sujeitos, no debate com
o aluno, uma prática intersubjetiva entre ensino e aprendizagem, inclusive no
momento e no modo de avaliação. A Filosofia não
detém o conhecimento, e por isso, ela não pode aferi-lo em provas e
instrumentos técnicos, ela é busca do saber e deve construí-lo em conjunto com
o aluno.
Logo: ela não avalia quantidades, técnicas, respostas prontas, procedimentos e
fórmulas, “V” ou “F”, ela avalia, com outros métodos; lógicos, analíticos,
conceituais, argumentativos, problematizadores que orientam os juízos de valor,
faz a reflexão crítica, radical e de conjunto sobre a realidade. O que não se
verifica por Provas tradicionais.
O aprendizado filosófico se
auto-avalia no mesmo instante em que acontece. O papel do professor é orientar o aluno quanto ao
perigo dos juízos que geram preconceitos, discriminação, racismo, alienação,
violência, sustenta a ideologia que esconde as desigualdades, alimentam o
ceticismo ou o dogmatismo, entre outras.
Por fim, a Filosofia pretende o
desenvolvimento da autonomia intelectual do aluno, da formação do ser ético;
consciente de si, do outro, do mundo e do transcendente para que esse Ser tome uma posição diante da realidade
do mundo em que vive. E para isso, não há instrumentos estáticos e técnicos que
avaliem, há sim, caminhos que podem ou não levar ao despertar da consciência.
E, é nesse sentido que o ensino da Filosofia deve caminhar, caso queira ser
verdadeiro.
Ainda assim, alguns dizem que a
nossa sociedade e sistema educacional exigem provas e avaliações. Há
vestibulares, concursos, e os alunos devem se preparar para essa realidade. Eu
digo que as provas não preparam
ninguém para estes fins, ainda que tentem, pois, não é a prova em si, que faz o aluno passar em um vestibular ou concurso, é
sim, o conhecimento, o discernimento, o raciocínio analítico, dialético, lógico
a capacidade argumentativa, de leitura, interpretação e escrita, a capacidade
de discernir, comparar, julgar e concluir de modo crítico o conteúdo. É o seu
desenvolvimento cognitivo que lhe dá as condições necessárias para enfrentar as
diversas realidades humanas e sociais, justamente o que a Filosofia, mas não só
ela, busca desenvolver, e que
instrumentos como a Prova não fazem,
e ainda escondem a realidade do conhecimento do
aluno atrás de um modelo de memorização.
Se a prova fosse
exercício para fins de concursos como vestibulares, todos os alunos passariam,
pois estes fazem prova desde o primeiro dia de sua vida escolar.
Outros ainda poderiam pensar: mas
então como avaliar sem prova? Eu digo
que há inúmeros métodos de avaliação melhores e mais significativos que a Prova, como, por exemplo: O debate em
sala, em que o aluno expressa seu pensamento e entendimento do conteúdo
estudado, a leitura interpretativa e associação entre textos como (filmes,
jornais, revistas especializadas) em que o aluno desenvolve o poder de crítica
e conseqüente absorção do conteúdo, há pesquisas e apresentações sobre estudos
de casos, discussão da matéria a partir de notícias, de TV, de Teses, teorias de pensadores e cientistas da área
afim, entrevistas, questionário, discussão em grupo, resenhas, relatórios,
apresentação de trabalhos, seminários e uma infinidade de processos avaliativos
melhores e mais adequados e interessantes que a Prova tradicional.
Na área das Ciências, por exemplo,
pode-se fazer o mesmo, a partir da História de cada Ciência como a História da
Matemática que é belíssima. A avaliação do conhecimento nas Ciências exige meios
mais práticos e experimentais e não de perguntas e respostas. Este deveria ser
apenas o momento das anotações e relatórios do aprendizado para discussão e
checagem e não a avaliação final do conhecimento. Ocorre que todos os outros
métodos são mais trabalhosos que a Prova
e exigem mais tempo de preparação, estudo e pesquisa por parte do Professor.
Por fim, todos estes exemplos,
põem o aluno e o Professor, juntos, diante do problema do conhecimento. E é aí
que se dá a troca. Aí sim, o conhecimento adquirido, a evolução, dificuldades,
problemas e soluções aparecem em uma relação de troca constante. São vários os
modos de avaliação, cada qual deve ser adequada ao propósito da disciplina, não
compreender essa adequação ou tentar padronizar um método apenas. Pode como
ocorre, corromper o ensino e aprendizagem.
E aos que pensam que outros métodos não se aplicam à sua
disciplina digo que, se não for
possível avaliar o aprendizado de uma disciplina pelo método direto entre
professor /aluno, também não é possível ensinar tal disciplina.
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1) Dislexia é uma específica
dificuldade de aprendizado da Linguagem: em Leitura, Soletração, Escrita, em
Linguagem Expressiva ou Receptiva, em Razão e Cálculo Matemáticos, como na
Linguagem Corporal e Social. Não tem como causa falta de interesse, de
motivação, de esforço ou de vontade, como nada tem a ver com acuidade visual ou
auditiva como causa primária. Dificuldades no aprendizado da leitura, em diferentes
graus, é característica evidenciada em cerca de 80% dos disléxicos. Veja também
Disgrafia e Discalculia. ( Dislexia; você
sabe o que é? – Zeneida Bittencourt)
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